Autistas precisam de mais acolhimento educacional

Blog do  Amaury Alencar
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Atendimento educacional especializado para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um sonho para quem tem filho com esse diagnóstico. Das 126.548 pessoas com autismo no Ceará, das quais 43.615 vivem em Fortaleza, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente 26.248 estão frequentando escolas (da creche ao Ensino Médio). Em 2024, a Prefeitura da Capital matriculou 21.082 crianças com TEA e o Estado, 5.166.


Segundo a vice-governadora do Ceará, Jade Romero (MDB), existem mais de 28 mil crianças autistas em Fortaleza que ainda aguardam o laudo médico confirmando o transtorno. Parte delas já frequenta escolas, mas sem o atendimento diferenciado.
Apesar do que já tem sido feito, ainda falta rede de apoio real. O Ministério Público do Ceará (MPCE) também atua para garantir que as escolas estejam preparadas para receber alunos com autismo de forma inclusiva.
A promotora de Justiça Grecianny Cordeiro, ao lembrar que não existe em Fortaleza uma escola específica para crianças diagnosticadas com TEA, afirma que é preciso preparar as unidades para serem mais inclusivas, solidárias e darem um tratamento de respeito. A falta de conhecimento e preparo de professores e demais profissionais da educação sobre o autismo pode dificultar a inclusão e o suporte adequado.


Relatos
Há relatos de pais que descrevem evolução e outros que não veem a escola como ambiente acolhedor. Recentemente, uma criança foi agredida em sala de aula pelo cuidador Lucas Fernandes de Souza que, ao invés de dar suporte ao garoto autista de cinco anos, deu “uma manobra mal dada”, resultando em escoriações. O caso, que foi parar na Delegacia, aconteceu na Escola Francisco Antônio Fontenele, em Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza.
Erlane Fontenele, de 42 anos, é mãe de José Emanuel, 6. Eles estavam no Terminal do Papicu, na Capital, aguardando o ônibus. O menino conduz um colar identificativo e com gestos pedia à mãe para comprar um pirulito. Eles iam para a sessão de terapia.
O garoto fala palavras soltas sem ainda formar frases. O atendimento é bancado parte por ela e parte pelo plano de saúde. Erlane disse que o filho frequenta uma escola particular e não tem o que reclamar.
Adriano e Sinaria Vasconcelos são pais do pequeno Samuel. Aos três aninhos, ele apenas balbucia as sílabas: papá e mamã. O garoto está matriculado no Infantil 3 da Escola Macário José de Farias, na localidade de Pitombeiras, no Município de Cruz, interior do Ceará.
Mesmo sem ter recursos multifuncionais para atendimento especializado na escola, os pais se dizem satisfeitos. O Samuel está numa sala com outros 15 alunos e tem uma cuidadora, mesmo sem ter ainda o laudo de autismo.


Sinaria disse que o maior medo dela era que o filho passasse por situações de preconceito, julgamento. “Ele é uma criança muito amorosa, foge de confusão e não sabe se defender de agressão.”
Fortaleza
Na Capital, a rede municipal matriculou 21.082 crianças autistas em 2025, contra 17.403 no ano passado, segundo a coordenadora de Diversidade e Inclusão da Secretaria Municipal da Educação (SME), Mônica Costa. No Estado, foram matriculados 5.166 estudantes com TEA. Em 2024, o número chegou a 3.203.
O secretário da Educação de Fortaleza, Idilvan Alencar, explicou que “os assistentes de inclusão desempenham um papel fundamental. Por isso, ampliamos de 766 para 1.444 o número de profissionais em sala de aula. E esse quantitativo continuará aumentando”. Atualmente, a rede estadual conta com 420 Salas de Recursos Multifuncionais (SRM), destinadas ao Atendimento Educacional Especializado (AEE), com previsão de criação de novas salas até o final do ano.


Mônica Costa explicou que os estudantes com autismo estão matriculados em salas regulares onde atuam mais de 9 mil professores. Varia de 3 a 5 o número de crianças autistas por cuidador. Assim, seria preciso 4.216 para atender, o que diz a lei, nas escolas municipais. Ela destaca que no AEE atuam 462 professores para realizar o acompanhamento dos alunos.
A reportagem perguntou à coordenadora de Diversidade e Inclusão qual a orientação para evitar a discriminação entre os estudantes. “A SME compreende que a prevenção à discriminação e o desenvolvimento de práticas inclusivas para atender a todos com suas diferenças individuais, sociais, culturais e econômicas demanda ações formativas que fortaleçam essas práticas. Assim sendo, esclarecemos que a temática da Educação Inclusiva e Diversidade está presente nas ações de formação continuada de todos os profissionais da educação”, informou.


Já a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) conta com dois Centros de Referência em Educação e Atendimento Especializado (Creaece), em Fortaleza e Crateús, e deve inaugurar mais um em Iguatu. Além disso, o Estado tem acordos de cooperação com 51 organizações não-governamentais, presentes na Capital e em outros 35 municípios, para ampliar o alcance do atendimento educacional especializado.
Em Fortaleza, oito escolas contam com Núcleos de Apoio Pedagógico Especializado (Nape), que disponibilizam equipes multiprofissionais com pedagogos, assistentes sociais, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais. Os Napes também podem atender escolas próximas. Além disso, a rede conta com 571 profissionais de apoio (cuidadores) e 174 intérpretes de Língua Brasileira de Sinais (Libras), garantindo suporte diário à permanência e à aprendizagem dos estudantes.
A titular da Seduc, Eliana Estrela, destacou que foram alcançados avanços importantes, mas é preciso continuar trabalhando para a superação de práticas discriminatórias e a construção de uma cultura escolar verdadeiramente acolhedora. A presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais, Regina Lemos, afirmou que é preciso garantir apoio concreto às escolas e que a matrícula é apenas o primeiro passo. “A inclusão real depende de formação continuada para professores e professoras, agentes de apoio em sala de aula e condições estruturais que assegurem o direito à aprendizagem de todos os alunos e alunas.”


Projetos
Uma proposta de lei em tramitação na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) visa obrigar as escolas públicas e privadas a fornecerem protetores de ouvidos gratuitamente para alunos com TEA. O objetivo é reduzir o impacto da hipersensibilidade auditiva em ambientes escolares e evitar crises.
Foi aprovado na Câmara dos Deputados, o projeto de lei para garantir o atendimento em escolas públicas e privadas. Agora, o texto segue para votação no Senado. Outro projeto, da deputada Luizianne Lins (PT/CE), prevê a instalação de salas de acolhimento sensorial para pessoas com TEA em instituições federais de ensino superior. A proposta está em análise.
(Por Elizabeth Rebouças —
Com colaboração de
Bianca Bessa)

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