Agência Brasil
A
perda de renda devido à crise econômica causada pela pandemia de
coronavírus levou muitos inquilinos a buscarem a renegociação dos
aluguéis. Um levantamento da Associação das Administradoras de Bens
Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC) indica que pelo menos um em
cada cinco aluguéis residenciais passaram por processo de renegociação
nos últimos meses no estado de São Paulo.

Segundo o presidente da associação, José
Roberto Graiche Júnior, os descontos nos aluguéis variaram entre 10% e
50%, por períodos de aproximadamente três meses. Segundo ele, em 90% dos
acordos, os valores foram reduzidos apenas temporariamente e deverão
ser repostos em parcelas nos próximos meses. Apenas 10% foram reduções
sem retorno.
Esse processo de acerto entre os moradores
dos imóveis e os proprietários evitou, na avaliação de Graiche, um
aumento expressivo da inadimplência, que permaneceu baixa, mesmo com a
crise. “Inadimplência não aumentou, tendo em vista que houve essa
composição entre os proprietários e inquilinos”, disse. Em média, antes
da crise, os atrasos dos pagamentos de aluguel representavam 1,8% do
total dos contratos de locação e ficaram, de acordo com ele, em 2,8% nos
últimos dois meses.
Negociar para não perder
O vice-presidente de Gestão Patrimonial e
Locação do Sindicato da Habitação (Secovi) de São Paulo, Mark Turnbull,
disse que a orientação é negociar, lembrando que para os donos, pode ser
mais caro deixar a casa ou o apartamento vazio do que uma redução do
valor do aluguel. “Não vale a pena para o proprietário perder esse
inquilino, que é uma renda. Se perde o inquilino, fica sem o aluguel e
tem despesas fixas”, diz.
Os dados do Secovi referentes a abril já
refletem a desaceleração sofrida pelo mercado de aluguéis na crise.
Segundo a pesquisa mensal, o tempo que um apartamento pode ficar vazio
até ser feito novo contrato ficou entre 27 e 57 dias na cidade de São
Paulo. No mesmo período de 2019, esse tempo variava entre 24 e 49 dias.
Para as casas, o tempo de espera por novos inquilinos aumentou de 18 a
43 dias no ano passado para 20 a 53 dias no último mês de abril.
Turnbull destaca que a crise vai definir os
rumos dos aluguéis daqui para a frente. “O que vai continuar daqui para a
frente é a negociação. Quem vai querer pagar, vai querer pagar menos”,
enfatiza. Mesmo os reajustes anuais dos contratos, que costumam seguir a
inflação medida pelo Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), devem
ser repensados. “O proprietário não vai fazer esse ajuste, ou vai fazer
até metade disso”, afirma sobre o percentual do índice de inflação, que
acumula alta de 7,24% nos últimos 12 meses.
Quando negociar
Caso o inquilino perceba que a perda de
renda vai dificultar o pagamento do aluguel estipulado para o imóvel
onde vive, o ideal é procurar o proprietário ou a administradora e
buscar um acerto, recomenda o vice-presidente da comissão de Direito
Contratual da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo, Victor Cerri.
“O exercício que tem que se fazer é ver se aquela inadimplência surgiu
por causa da pandemia”, diz o advogado sobre a avaliação que os donos de
imóveis devem fazer na hora de negociar com os locatários.
Ele lembra que os inquilinos também devem
ser flexíveis e entender as necessidades do dono do imóvel. “O locador,
muitas vezes, tem isso como única renda”, diz Cerri. Um levantamento do
Secovi mostra que 70% dos proprietários têm só um ou dois imóveis.
“O que a gente orienta é fazer concessões
recíprocas. Talvez postergue o pagamento desse aluguel que ficou aberto,
talvez não onerando o locatário com multas”, exemplifica o advogado a
respeito de possibilidades que podem ir para a mesa de negociação. Ele
diz que caso as primeiras conversas não deem resultado, o inquilino pode
buscar um mediador para tentar conduzir os termos. “Procurar um
intermediário, uma administradora, uma imobiliária. Não sendo eficaz,
talvez buscar um advogado habilitado”, acrescenta.
Cerri ressalta ainda que mesmo nos casos em
que não há um contrato formalizado por escrito, os locatários têm os
direitos assegurados por lei.
A produtora Marina Barbosa, de 26 anos, foi
uma das que buscaram readequar o aluguel da casa onde vivia na zona
oeste da capital paulista. “Os trabalhos diminuíram, alguns acabaram.
Teve gente que ficou praticamente sem trabalho”, contou, ao falar sobre
como a pandemia afetou a vida profissional dela e das duas amigas com
quem dividia a moradia.
“A gente tem amigos que acabaram tendo boas
resultados com a negociação”, lembra sobre o impulso para pedir a
redução do valor que pagava pelo imóvel. Mas, apesar das cartas enviadas
à imobiliária e à proprietária, e o auxílio de uma advogada, o
resultado acabou ficando aquém do esperado. “Não teve negociação”,
resume. No final das conversas, foi concedido um desconto de R$ 130 do
valor total de aluguel, R$ 1,5 mil, muito abaixo dos 50% pedidos
inicialmente.