Após nova verificação do estado de saúde de cada um deles, foram levados até o hotel, na mesma base aérea, onde vão ficar por 18 dias, período de quarentena determinado pelo governo brasileiro. De acordo com o Ministério da Defesa, até aquele momento, todos estavam assintomáticos e apresentavam bom estado de saúde.
A cerca de 12 quilômetros dali, trabalhadores corriam para montar suas barracas da Feira Coberta de Jundiaí, tradicional mercado popular de alimentos na cidade. A rotina mantinha-se inalterada, a despeito da movimentação da imprensa e de militares na cidade. “Já chegaram?”, perguntou à reportagem o aposentado José do Carmo Simões, de 72 anos, que vendia seus abacaxis e melancias. Ele ignorava completamente a data e a hora de chegada do grupo repatriado. “Confio no que dizem as autoridades, que disseram não ter risco. Se os trouxeram para cá, eles vão ser bem-tratados e, quando saírem, vão conhecer a nossa hospitalidade. Espero que voltem para as suas casas falando bem da nossa cidade”, entusiasmou-se.
A mesma opinião tinha o fotógrafo Geovaine de Oliveira, de 47 anos, para quem acertou o governo brasileiro em “resgatar outros brasileiros em situação de perigo no mundo”. No entanto, ele lamenta que “os brasileiros que precisam de ‘resgate’ aqui dentro, em Anápolis mesmo, permaneçam abandonados”. “Veja o nosso posto de saúde. Lamentavelmente, e digo sem criticar o esforço para buscar nossos conterrâneos, se alguém precisar do posto médico vai sofrer o que os brasileiros na China não sofreram.”
O prefeito de Anápolis, Roberto Naves, não esconde a satisfação de a cidade ficar em evidência nacional. “Você vai ver que quando tudo passar, os anapolinos sentirão até orgulho”, diz. Naves afirmou à reportagem que no início da última semana chegou a ser pressionado por moradores para que buscasse formas de recusar a recepção dos brasileiros vindos da China, mas que tão logo confirmado o local de quarentena, passou a fazer um esforço para informar os moradores de que não havia qualquer risco, ainda que algum dos repatriados tivessem doentes.
“Nenhum deles está com o vírus, ou pelo menos não teve sintoma, mas, ainda que tivessem, eu fiz um esforço, com entrevistas, vídeos, mensagens, para tranquilizar a população de que não havia qualquer risco de se espalhar o coronavírus a partir da base aérea”, afirmou. Deu certo. Os moradores com quem VEJA conversou ao longo de sábado e domingo não demonstraram medo. Um deles até reclamou do esforço e dos gastos com a repatriação, mas não se apegava a medo de transmissão da doença.
A programação é que fiquem completamente isolados até o dia 26 de fevereiro. Assim que os aviões pousaram, o general Manoel Luiz Narvaz Pafiadache, secretário de Pessoal, Ensino, Saúde e Desporto do Ministério da Defesa, afirmou que “todos os passageiros estão muito bem de saúde, estão assintomáticos.” Às 10h da manhã, após um período de descanso, o grupo de repatriados assistiu a um vídeo no qual lhes foi apresentada a área da base disponibilizada para a estada de isolamento.
Há a previsão de que o presidente Jair Bolsonaro vá ao local após o período de quarentena. Mas para recepcioná-los gravou um áudio dando-lhes as boas-vindas ao país. O áudio foi transmitido assim que entraram no espaço aéreo brasileiro. A atitude marcou a mudança de atitude do presidente, que inicialmente havia dito que o governo que não tinha intenção de buscar o grupo.
A modificação da postura presidencial não passou despercebida por Jean Carlo Soares Pereira, de 41 anos, encarregado de obras e morador de Anápolis. “É marketing político. Ele disse que não queriam contaminar o resto do país, que o problema era deles que foram para a China, agora se passa de herói. É tudo marketing.”
Estratégia política ou não, o aposentado José Neves de Siqueira Júnior, morador de Belo Horizonte, estava num misto de gratidão e cansaço, quando falou com VEJA no fim da tarde sábado. Ele havia entregue na prefeitura de Anápolis uma carta, na qual agradece aos brasileiros e à cidade pelo apoio a seu filho, o universitário Victor Campos Moura Neves e Siqueira, que faz um intercâmbio no país. “Estou esgotado e vou tirar o domingo para Deus, para agradecê-lo, depois de uma longa noite de sábado, esperando meu filho retornar ao Brasil.” Ele foi um dos poucos familiares do grupo chegado da China a ir desde já para a cidade. “Obrigado, obrigado”, repetia, agora, mais tranquilo.
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