Deixar lembranças
boas nas mentes de pessoas queridas foi o objetivo dos últimos anos de
vida de Gilson Gomes Filho. O cearense passou seis anos lutando contra
um câncer de intestino descoberto em estágio avançado em 2013.
Determinado a viver até o derradeiro momento com felicidade, ajudando a
família, dando palestras para inspirar outros na mesma situação e criar
um legado para a filha, Maria, o homem decidiu gravar áudios contando
suas experiências. O pedido final foi para que os ensinamentos fossem
transformados em livro. Sete meses após sua morte, a família tenta
realizar o desejo.
Janaína Praça
Pereira, 44, será a responsável por organizar os áudios deixados pelo
marido. “A princípio ele achava que seriam áudios para ajudar as pessoas
que tivessem passando por esse momento ou nas suas caminhadas de
oração. Mas quando ele terminou de gravar, já no hospital, me disse que
são os ensinamentos que gostaria de dar ao longo da vida da nossa
filha”, disse. Maria, filha do casal de apenas 6 anos, nasceu no mesmo
ano em que o pai descobriu a doença. Ela acabou sendo a maior motivação
de Gilson.
Como co-fundador
da Comunidade Católica Missionária Um Novo Caminho, o cearense passou
parte da vida evangelizando, dando testemunhos sobre a fé e as
transformações que teve na vida. Anos antes do câncer, Gilson passou por
outra grande mudança. Após atingir a obesidade mórbida, ele passou por
uma cirurgia bariátrica e ficou decidido a se tornar um triatleta.
A
jornada culminou na conquista de um Ironman, modalidade de triathlon,
completo. O
amor por esportes foi reconhecido pelo jogador de futebol americano Tom
Brady, que gravou um vídeo para Gilson depois de se emocionar com sua
trajetória. A história é contada em um dos “capítulos” gravados por Gilson.
Nesse período,
enquanto diversos casais de amigos da comunidade constituíam suas
famílias, Janaína e Gilson tentavam ter filhos, mas sem sucesso. Foram
11 anos esperando até que Maria chegou. “Depois que a gente descobriu a
doença foi que vimos o porquê que demorou tanto. Deus sabia que ela
seria o combustível essencial para ajudar a gente a passar por esse
momento”, lembra a esposa. Além dele, seu pai e a mãe de Janaína
receberam diagnósticos de câncer ao mesmo tempo. Atualmente, o único que
ainda luta contra a doença é o pai de Gilson.
Perder a mãe e o
marido em intervalo de poucos meses não foi fácil para Janaína, que
continua buscando forças na filha, descrita por ela como “milagre”. A
administradora lembra com carinho da vida de Gilson e da relação dele
com Maria. “Ele vivia para ver a Maria crescer. Adorava chegar do
trabalho, porque era o momento em que ela estava em casa e corria para
abraçá-lo. Era uma convivência bem intensa e bem dedicada”. Ela relata
que Gilson frequentemente dizia aos médicos que o papel deles era fazer
com que ele vivesse o suficiente para que Maria tivesse lembranças do
tempo que passaram juntos. Por isso, um capítulo também é destinado a
ela.
Gilson conseguiu o
que queria. Mesmo ainda não tendo escutado o áudio deixado pelo pai,
Maria fala nele e lembra de atividades que faziam juntos. “Eu gosto
muito do meu pai. Qualquer coisa que eu peço, ele faz para mim. Eu gosto
muito dele e da minha mãe também. Fico muito feliz porque tenho um pai
tão maravilhoso e carinhoso comigo”, conta a menina, sem timidez. Ela
fala sobre as vezes que dançavam juntos, tiravam fotos e brincavam de
bonecas.
Devido a pouca
idade, Maria nunca teve dimensão da gravidade da doença do pai. Quando
Gilson deu entrada no hospital dois dias antes de morrer, alguns meses
após ter decidido parar de fazer quimioterapia para não prolongar o
sofrimento, Janaína sentou para conversar com ela e explicou que, apesar
de esforços dos médicos, às vezes as pessoas adoecem e “não dá para
consertar”.
A memória viva do
pai, alimentada por fotos espalhadas na casa e pelas recordações dos
familiares, não deixa que a dor da morte se sobressaia aos momentos bons
vividos pelos dois. Maria mostra feliz uma foto de Gilson com ela ainda
bebê “toda descabelada” que é exposta em um porta retrato na sala. “Não
houve desesperança. Mesmo com toda a dificuldade, nunca vi o Gilson
lamentando nada. Eu só ouvi palavras de força, de coragem e de fé”,
relembra Janaína. A mulher também ganhou um áudio falando sobre o
encontro e o amor dos dois.
Com os áudios já
transcritos por uma amiga da família, o próximo passo é organizar os
capítulos e montar um projeto para o livro. A parte financeira ainda é
um desafio para a família e amigos de Gilson, que não sabem ainda como
vão custear a publicação. A meta é lançar em 2020, ano que o cearense
completaria 50 anos. Para Janaína, o livro seria uma realização. “Quero
que a Maria receba esse presente do pai dela. O livro fala exatamente o
que ele fez: passar a mensagem de que a gente pode fazer diferença no
mundo, na vida das pessoas, levando o bem e levando a palavra de Deus”.
Serviço
Para ajudar na publicação do livro
Telefone: 98844 9006
o Povo