Aulas online
contam ou não contam como dia letivo nas escolas? O conteúdo
repassado por meio remoto pode ou não ser considerado dado pelos
professores? Para orientar as redes de ensino e ajudar a responder a
essas e outras questões, o Conselho Nacional de Educação (CNE) prepara
uma resolução e um parecer sobre educação remota e retomada das aulas
após a suspensão das atividades presenciais para o combate à pandemia do
novo coronavírus (covid-19).
De acordo com a conselheira do CNE, que está
à frente da discussão das medidas, Maria Helena Guimarães de Castro, a
intenção é que uma primeira versão das normas seja finalizada ainda esta
semana para serem submetidos a consulta pública.
“Estados, municípios e conselhos [estaduais e
municipais] estão tendo papel importantíssimo neste momento, que é
inédito para Brasil e para o mundo. Ninguém sabe o que fazer”, diz a
conselheira, que participou nessa quarta-feira (8) de seminário online, promovido pelo CNE, pelo movimento Todos pela Educação e o Banco Mundial.
“A grande dificuldade que o Brasil, assim
como os demais países, está enfrentando é a situação imprevisível em uma
área que não tem tradicionalmente a cultura do digital, do trabalho
remoto ou da educação a distância. Isso é novo e complexo para quem está
trabalhando com educação básica nas escolas públicas e particulares”,
acrescenta.
Segundo Maria Helena, os documentos levarão
em consideração a desigualdade brasileira em termos, por exemplo, de
infraestrutura e de acesso a meios digitais e à internet. O documento
irá esclarecer quais são os meios remotos pelos quais a escola poderá
atuar. Eles vão desde a entrega física de materiais para as famílias e
aulas pela TV e rádio às vídeoaulas transmitidas pela internet.
Outra questão abordada deverá ser como as
escolas podem atuar no retorno dos estudantes às aulas regulares,
orientando o tipo de avaliação que deverá ser feita para verificar se o
conteúdo, caso tenho sido disponibilizado, foi aprendido ou não pela
turma. “Momento extremamente delicado, muito sensível. Todos tiveram uma
fase difícil de ruptura em relação ao cotidiano. Então, estamos
chamando atenção para o acolhimento, que é muito importante, e para
avaliações diagnósticas. Caberá às escolas e redes de ensino definir
instrumentos de avaliação diagnóstica para ver até onde alunos
conseguiram avançar”, explica Maria Helena.
O parecer e a resolução servirão como
orientações para as redes e como regulamentação da medida do governo
federal que autorizou que as escolas tenham este ano menos que 200 dias
letivos, desde que cumpram 800 horas de ensino. A medida foi bem aceita
pelos sistemas de ensino, mas deixou dúvidas sobre como esse calendário
pode ser cumprido nas diferentes etapas. Os conselhos estaduais e
municipais deverão também definir a melhor maneira de orientar as
regiões em que estão inseridos.
Cronograma do Enem
Segundo Maria Helena, os documentos trazem
um artigo específico sobre avaliações nacionais, como o Exame Nacional
do Ensino Médio (Enem). “No nosso entendimento, deverão esperar o fim
dessa pandemia, desse distanciamento, do fechamento das escolas para que
sejam revistas as avaliações nacionais, inclusive o Enem, que deverá
ser repensado do ponto de vista de seu cronograma”, diz.
O Ministério da Educação (MEC) decidiu manter as datas do Enem,
divulgadas no ano passado. A edição impressa será aplicada nos dias 1º e
8 de novembro e a digital, nos dias 11 e 18 de outubro. De acordo com a
pasta, o cronograma foi mantido para dar segurança aos estudantes de
que o exame será realizado este ano.
O presidente do CNE, Luiz Roberto Curi, que
também participou do seminário, ressalta que a resolução e o parecer do
colegiado são temporários e devem ter vigência enquanto durarem os
impactos do isolamento social e do fechamento das escolas. “Estamos
falando de medidas temporárias, medidas que têm prazo para acabar”.
Prejuízos
A presidente do Conselho Nacional de
Secretários de Educação (Consed), Cecilia Motta, defendeu que as escolas
mantenham contato com as famílias e com os estudantes e que se esforcem
para oferecer atividades, mesmo que não tenham a mesma qualidade das
atividades presenciais e mesmo que depois seja necessário repor as
aulas. “É uma maneira de minimizar as perdas que teremos, porque
teremos, não há dúvida disso”.
Segundo Cecilia, que é secretária estadual
de Educação de Mato Grosso do Sul, cada estado está tomando as medidas
possíveis para a região lidar com a suspensão das aulas. Em Mato Grosso
do Sul, as escolas estão buscando ofertar aos alunos desde aulas online
até materiais para que possam trabalhar em casa. “Dois por cento dos
estudantes não estão sendo atendidos de maneira nenhuma. Isso, para nós,
é muito preocupante porque vemos a questão da desigualdade. São alunos
[para os quais] temos de nos preparar para receber no retorno à
escola”.
Ela defende, mesmo que não cheguem a 100%
dos alunos, as atividades remotas. “Estamos preocupados com a
aprendizagem. Mas o fato de a criança e o jovem, que ficavam oito horas,
dez ou quatro horas na escola, chegarem em casa e não ter nada de
atividade é uma questão muito delicada e perigosa. Mesmo não tendo a
qualidade que a gente espera, existe a questão social. Os estudantes
estão dentro de casa com atividade que está sendo cobrada pelo
professor”.
Enquanto os estados são responsáveis
prioritariamente pelo ensino médio, aos municípios cabe o ensino
infantil e o fundamental. Com estudantes mais jovens, o presidente da
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Luiz
Miguel Martins Garcia, defende que, no processo de reorganização do calendário escolar, é necessário, primeiramente, esgotar todos os esforços para cumprir as 800 horas de maneira presencial.
“Não somos contra a EaD [educação a
distância], somos a favor de encontrar elementos que respeitem os alunos
no seu estágio de desenvolvimento e na forma de aprender”, diz Garcia,
que ressalta a necessidade de apoio tecnológico, técnico e metodológico
da União e dos estados às cidades brasileiras.
No Brasil, há suspensão de aulas em todos os
estados para conter o avanço da pandemia do novo coronavírus. A medida
não é exclusiva do país. No mundo, de acordo com os últimos dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(Unesco), que monitora os impactos da pandemia na educação, 188 países
determinaram o fechamento de escolas e universidades, afetando cerca de
1,6 bilhão de crianças e jovens, o que corresponde a 91,3% de todos os
estudantes no mundo.