Era difícil acreditar que uma orquídea da espécie Trigonidium Acuminatum pudesse
ser encontrada no estado do Ceará. Isso porque poucas regiões do estado
oferecem condições adequadas para o surgimento da planta. Mas, foi em
uma expedição pela Serra de Uruburetama que pesquisadores, naturalistas e
fotógrafos registraram, pela primeira vez, a presença da espécie em
solo cearense. "Não é que ela seja rara, ela ocorre em outros estados.
Para essa região é um registro interessante, porque não tinha nenhuma
ideia que ela ocorresse por aqui", reforça o pesquisador e naturalista
presente na expedição, Roberto Otoch.
Ainda sem nome popular no estado, uma das
hipóteses para justificar sua permanência na serra é o pouco interesse
humano pela espécie, já que ela não apresenta características comuns a
outras plantas da família. "O pessoal nem pensa que ela é orquídea. Na
Serra de Uruburetama chamavam ela de parasita. Mas, não tem nada a ver.
Ela não é uma planta parasita. Orquídea nenhuma é parasita", alerta
Otoch.
Pequena e delicada, o nome Trigonidium faz referência à
posição das suas pétalas, que acabam por formar um triângulo. Algumas
delas podem ser bastante perfumadas e são de fácil cultivo em regiões
que a favorecem. Ainda assim, ela não é uma espécie que interessa aos
orquidários, segundo o pesquisador. "A importância dela é mais pelo
registro da espécie. Ela não é uma orquídea que chama atenção e nem é
despertada pelos traficantes, porque ela não tem beleza. As flores são
muito pequenininhas", conta Otoch.
Roberto também faz parte da Associação dos Orquidófilos
do Ceará. A equipe está catalogando a fauna e a flora do estado do
estado. "A gente já tem um estudo bem extenso e completo. Isso vai para o
catálogo de dados", explica. Somente Uruburetama, por exemplo, abriga
entre 60 e 65 espécies de orquídeas das 105 já registradas em todo o
Ceará.
A Serra de Uruburetama, assim como outras serras do
estado (Baturité, Ibiapaba, Maranguape, Aratanha), têm uma importância
evolutiva enorme, conforme Roberto. "São testemunhas de que um dia e
Amazônia chegou aqui, a floresta do Brasil central e a Mata Atlântica.
Porque nessas nossas florestas, está tudo misturado". Em termos de
evolução de espécie, a Serra de Uruburetama é uma das mais importantes
para o Estado.
Mesmo assim, a região conhecida como "Mãe da Rainha das
Orquídeas", não possui nenhuma Área de Proteção Ambiental (APA). Os
pesquisadores e moradores da região vêm, há algum tempo, solicitando
esse reforço para a serra. Em 2018, a secretaria do Meio Ambiente do
Estado do Ceará havia demonstrado interesse em construir uma APA na
serra, mas o projeto ainda não saiu do papel.
Conforme o naturalista Roberto Otoch, um dos principais
fatores que ameaçam a vegetação da Serra de Uruburetama é o cultivo
desenfreado de bananas. "Uruburetama foi massacrada por uma ação de
falta de planejamento de culturas não apropriadas. Tomaram a serra toda
de bananeira e os fragmentos florestais restantes são tão pequenos que
não estão garantindo a sobrevivência da fauna. A flora também já está
sofrendo muito, porque fauna e flora andam juntas", argumenta.
A serra também abriga uma das principais espécies de orquídeas, a Cattleya labiata,
que faz a região ser conhecida internacionalmente. Ao O POVO Online,
Otoch comentou se surpreender ao ainda encontrar variadas espécies na
serra que já perdeu 80% da sua cobertura florestal original devido à
exploração desordenada do cultivo de bananas. "Lá a situação é séria. É
muito mais grave do que se imagina.", finaliza. Para o pesquisador,
registrar uma nova espécie nesse local em que a vegetação sobrevive a
"duras penas", como ele mesmo coloca, é de extrema importância para o
Ceará.
O Povo